quarta-feira, 28 de setembro de 2011

A crise e o juro: fim do Sistema de Metas?

Luiz O. Stefanelli Potsch


“A discussão sobre a natureza e extensão da crise internacional, e mesmo sobre se esta designação tão sombria serve também para o momento pelo qual passa o país, foi atropelada pela decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de 31 de agosto que, para alguns, decretou o fim do regime de metas para a inflação.”



Foi com a frase anterior que Gustavo Franco, ex-presidente do Banco Central do Brasil (BC), iniciou seu artigo de análise sobre crises financeiras internacionais, publicado no Jornal Valor Econômico em 14.09.11.

A afirmação pode ser vista como um tanto exagerada, no entanto dada sua significativa repercussão nos dias posteriores entre economistas e analistas de mercado em geral, creio que mereça ser analisada com certo cuidado.

A decisão de cortar 0,5 ponto percentual na taxa Selic, reduzindo-a de 12,5% para 12% a.a., tomada na última reunião do Copom não era esperada nem pelos mais otimistas (ou pessimistas, no caso de detentores de ativos com remuneração atrelada a ela). Seu valor vinha em uma escalada de alta desde março de 2010, seqüência mantida até a penúltima reunião. Ou seja, a deliberação do último encontro dos membros do Comitê precedeu uma decisão oposta. A surpresa é que tal evento não ocorria desde os anos de 1998 e 1999, momento de elevada instabilidade macroeconômica internacional, que causou, entre outras, a mudança do regime cambial brasileiro, de fixo para flutuante.

Na ata de reunião do ocorrido, o Copom justificou a decisão mencionando fatores tanto internos quanto exteriores ao país. Segundo citado, o “ambiente macroeconômico se alterou substancialmente, [...] de modo a justificar uma reavaliação, e, eventualmente, reversão [da taxa básica]”. Além disso, “considera-se o cumprimento da nova meta de superávit primário, cerca de 3,15% do PIB, sem ajustes, em 2011”. Ou seja, a deterioração do cenário internacional, com menores projeções para as taxas de crescimento mundial, refletindo em queda dos preços das commodities e da demanda por produtos do Brasil, juntamente ao maior esforço fiscal do governo, indicariam uma oportunidade de rebaixamento dos juros.

Indiscutivelmente, o principal fator que vinha puxando o nível de preços para cima eram os choques de oferta domésticos e externos. Como exemplo, podemos citar o Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) – componente com peso de 60% no Índice Geral de Preços - Disponibilidade Interna (IGP-DI) – que registrou um aumento acumulado em 12 meses, a partir de julho, de 19,14% no meio agrícola.

No entanto, dado que em finais de setembro os preços ao consumidor já teriam tido tempo suficiente de incorporar os efeitos de tais choques, como igualmente afirmado na ata, uma redução do aperto monetário não traria riscos em termos de pressão inflacionária, visto que o IPCA, parâmetro para o sistema de metas, é um índice, justamente, ao consumidor. Com isso, neste último trimestre se encerraria “o ciclo de elevação da inflação acumulada em doze meses”.
Outra questão que poderia ter influenciado na decisão do Copom, apontada por certos analistas, foi a conhecida demora em adotar a mesma medida em finais de 2008, o que possivelmente tornou-se um ponto de agravamento da recessão econômica do ano seguinte.

Assim, dados os convincentes motivos técnicos expostos para chegar à decisão de 31 de agosto, parece não haver motivos claros para concluirmos positivamente sobre a veracidade da afirmação de que nossa autoridade monetária não estaria mais seguindo os rumos do sistema de metas para a inflação, tendo abandonado o compromisso firmado em seu decreto.

Agora, se isso é bom ou ruim, ou seja, se não seria uma decisão acertada a de “largarmos mão” de tal veículo de controle para que, desta forma, aceitando um ambiente mais inflacionista, pudéssemos atingir também maiores taxas de crescimento, já é outra discussão – tema para um próximo artigo.

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