domingo, 30 de outubro de 2011

Mercado Cambial e Refeições

Luiz Otávio Stefanelli Potsch

Todos nós sabemos que nosso famoso tripé de política macroeconômica – metas de inflação, ajuste fiscal e câmbio flexível – nunca foi cumprido à risca. Os índices de preços têm apresentados, sistematicamente, valores acima dos 4,5%, meta-centro, e são recorrentes as “mágicas contábeis” no intuito de alcançar os níveis de superávit primário prometidos. No entanto, o pilar do tripé que tem passado mais longe de ser cumprido é, sem dúvida, o do câmbio.

Faltam dedos nas mãos para listarmos todas as formas de intervenção que o governo e o Banco Central têm usado no mercado cambial. Compras de divisas no mercado a vista, no futuro, swap cambial, swap reverso, IOF para o movimento de capitais, taxação para dívidas no exterior, entre outras medidas, as chamadas “macroprudenciais”.

A taxa de câmbio é uma variável importantíssima no jogo comercial e financeiro dos países e, nesse sentido, é natural que nossas autoridades sofram pressões de todos os lados para mantê-la em patamares demandados. O que observamos, com isso, é que o regime cambial brasileiro deixou cada vez mais de ser flutuante sujo e tornou-se uma espécie de sistema de bandas cambiais, com a taxa girando em algo em torno de R$ 1,50 e R$ 2,30 por dólar.

Não defendemos, aqui, que esse mercado deva ser livre de toda e qualquer intervenção. Elevados volumes de capitais de curto de prazo em movimento e a conseqüente ampla volatilidade da taxa de câmbio são extremamente danosos ao ambiente econômico, seja em qual for o canto do mundo.

No entanto, como todo bom economista deve reconhecer, não existe almoço grátis. Assim, da mesma forma em que não é possível ficarmos com o dinheiro e o almoço simultaneamente, não podemos segurar o câmbio em patamares desejados sem que haja uma perda da credibilidade da política macroeconômica, com prejudiciais conseqüências futuras ao mercado cambial.

Uma evidência disso é a recente desvalorização sofrida pelo Real. Só no mês de setembro a taxa de câmbio em relação ao dólar subiu de R$ 1,58 chegando a R$ 1,90, um aumento por volta de 20%. No entanto, o Dollar Index, que mede o desempenho da divisa americana ante uma cesta de moedas, mostra que o dólar sofreu uma valorização de apenas 5,17% no mesmo período. Observamos, assim, que, em cenários de elevada aversão ao risco, a baixa confiabilidade do investidor estrangeiro nas autoridades de política do Brasil com relação ao respeito às instituições do mercado tem causado “derretimentos” maiores da moeda brasileira vis-à-vis aos ativos monetários de outros países.

Diversas medidas discricionárias com relação ao câmbio e outras variáveis relacionadas ao comércio exterior têm sido adotadas no alegado intuito de proteger a indústria nacional. Isso traz, ao fim e ao cabo, negativas conseqüências à credibilidade da política econômica do Brasil. Nossas autoridades devem tomar cuidado para que os remédios utilizados não se tornem piores do que a doença. Nosso governo, infelizmente, tem dado pouca atenção, no manejo de seus instrumentos, ao quesito refeições gratuitas...

terça-feira, 25 de outubro de 2011

(Des)emprego

Amiris de Paula


A recente mudança da política econômica de diminuição da SELIC (pelo menos no que podemos perceber das últimas reuniões do COPOM), ainda que ínfima, já gera incertezas na economia, afetando a atividade econômica e o comportamento, por exemplo, da taxa de desemprego. 

De acordo com pesquisa realizada pelo Seade (Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados) em parceria com o Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), a taxa de desemprego total passou de 11,0%, em julho, para 10,9% registrados no mês de agosto: Um acréscimo de apenas 27 mil postos de emprego. Nota-se, também, a manutenção da taxa de desemprego aberto em 8,3% e a de desemprego oculto, na qual teve uma pequena variação de 2,6% para 2,5%. Entre os setores de atividade, houve variação negativa no nível de ocupação na indústria (-0,6%, representando menos 19 mil postos de trabalho), comércio (-0,6%, menos 18 mil), construção civil (-0,2%, menos 3 mil) e agregado outros serviços (-0,7%, menos 11 mil). Somente o setor de serviços registrou um resultado positivo (0,4%, menos 47 mil). Esse dado preocupa posto que a taxa tem uma corriqueira e notável tendência declinante a partir do segundo semestre do ano, fato não observado ao longo do mesmo. Mostra, também, um desaquecimento do mercado de trabalho. 

Em uma abordagem crítica quanto à importância do trabalho na sociedade atual, cabe lembrar a conferência realizada na UFBA do filósofo húngaro Mészáros, enquanto o mesmo passava pelo Brasil. Meszáros abordou a temática sobre os “limites absolutos” do capitalismo, no qual um destes limites seria o papel do trabalho na sociedade. O trabalho, nesta perspectiva, é visto “como uma necessidade, tanto para os indivíduos que produzem quando para a sociedade como um todo”. Assim sendo, para Mészáros, o “desemprego perigosamente crescente, apresenta no trabalho um dos seus limites já que uma situação onde o trabalho seja visto como um problema, ou pior, como uma falha, tem em si um limite a ser resolvido”. 

Além de cada vez mais freqüentes manifestações e greves trabalhistas, o aparecimento de notícias de que o crescimento do índice de pessoas trabalhando em agosto foi o menor registrado dos últimos 12 meses sendo vinculadas nas mídias causa alarde. Começam, então, os questionamentos se o Brasil estaria entrando na lista dos países que estão sendo arrastados por ondas de manifestações de desempregados, como as que estão fervilhando na Grécia, bem como dúvidas quanto à manutenção da atividade econômica.  Sendo assim, segue-se o lento marasmo do mercado de trabalho para o panorama dos próximos meses. 

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

O Espírito Santo e a discussão dos royalties


Deyvid Alberto Hehr

O aumento no preço internacional do barril de petróleo e na demanda do mesmo , que teve como um de seus fatores de alavancagem o crescimento da economia chinesa, fez com que os rendimentos recebidos pelos estados  e municípios brasileiros com os royalties e participações oriundas do petróleo se elevassem em mais de 1200% nos últimos 12 anos segundo Ricardo Almeida Ribeiro da Silva, o que elevou o interesse dos demais estados e municípios  não beneficiados com os royalties.

Diante disso e a  aprovação da emenda Ibsen-Souto pela câmara dos deputados federais, que define uma modificação na estrutura de distribuição dos recursos, onde agora 50% seriam destinados ao Fundo Especial a ser distribuído entre os Estados e o Distrito Federal, de acordo com os critérios de repartição do Fundo de Participação dos Estados (FPE) e os outros 50% para o Fundo Especial a ser distribuído entre os municípios, de acordo com os critérios de repartição do Fundo de Participação dos Municípios (FPM), o debate acerca do destino dos recursos oriundos do petróleo vem se acirrando e ganhando força.  

Contudo, os argumentos levantados por ambos os lados (produtores e não-produtores) não apresentam nada de novo, pois os produtores se pautam nos impactos ambientais e no excesso de população que será atraída sem os Estados possuírem uma infra-estrutura correspondente a  nova realidade, deixando ainda mais precária à  qualidade de vida. Ao tempo em que os não-produtores se apegam na  idéia de que o petróleo é da união , e, portanto, não pode haver apenas alguns Estados e Municípios beneficiados. Isso faz com que a discussão saia do campo técnico e entre no político. 

Diante de uma discussão no âmbito político, temos um verdadeiro cabo-de-guerra aonde  já se sabe quem vai vencer, pois são  apenas dois estados lutando pela manutenção da atual forma de divisão. Porém, isso pode acarretar grandes problemas para o governo, uma vez que o mesmo ainda precisa votar questões importantes e para isso ter  a base aliada unificada.

No que tange ao ES, o resultado dessa disputa de forças políticas é algo que pode fazer o Estado voltar a ter uma maior dependência da União, retornando uma política de “Passar o Pires”, o que deixa o mesmo mais vulnerável . Isso se deve ao fato de havendo uma redistribuição dos royalties, o ES ter uma queda de receitas, que terá de ser compensada  por um aumento na participação de recursos recebidos de Fundos Especiais para que o mesmo não entre em bancarrota.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

O aumento do IPI e o paradoxo do comércio exterior brasileiro

Rayssa Deps Bolelli

No último mês de Setembro o governo brasileiro anunciou um aumento de 30 pontos percentuais no IPI (Imposto Sobre Produtos Industrializados) para veículos com menos de 65% de componentes nacionais ou regionais. (excluindo-se os países do MERCOSUL e México), o que pode elevar os preços dos produtos de 25% a 28%. Aliado ao aumento dos impostos, o decreto governamental traz outras medidas, como a obrigatoriedade em investimento e inovação por parte de empresas liberadas do aumento do imposto. O objetivo da medida, segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, foi o de proteger a indústria nacional em um momento de crise e valorização do real frente ao dólar.

A notícia gerou, como se esperava, reações internacionais. Japão e Coréia do Sul, dois grandes fabricantes de automóveis, contestaram no Comitê de Acesso ao Mercado a decisão do governo brasileiro, o que pode levar a uma disputa na OMC (Organização Mundial do Comércio).Contudo, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, divulgou que a reclamação apresentada por esses países, foi apenas um “pedido de informações”, e que o Brasil daria as informações que pedirem. Caso a disputa seja levada além dos “pedidos de informação”, há uma expectativa de que o Brasil não deve recuar

O interessante aqui é a identificação de uma postura brasileira ambígua. Recentemente, o Brasil ganhou na OMC o direito a retaliar os produtos americanos, devido aos altos subsídios em cima do algodão. Além desta mercadoria, tanto os EUA quanto outros países subsidiam diversos outros produtos agrícolas, prejudicando as vendas brasileiras no exterior, e, devido a estes fatos, vivemos reclamando na OMC o cumprimento das regras de comércio internacional, que não permitem este tipo de intervenção. Outra questão, foi o último discurso da presidente Dilma Rousseef, que defendia a união da comunidade internacional para combater a crise, e a manutenção do livre comércio sem protecionismos. Ou seja, pregamos um mundo sem barreiras comerciais ao mesmo tempo em que implantamos aqui as mesmas barreiras.

Sendo assim, esta posição paradoxal do nosso país deve ser vista com preocupação, pois além de ferir três acordos da OMC (Acordo Geral de Tarifas e Comércio,Acordo de Subsídio e Acordo sobre Medidas de Investimento Relacionadas ao Comércio) , as ações incoerentes do Brasil levam a uma perda de credibilidade internacional. Além disso, a atitude brasileira pode abrir precedentes para que outros países possam agir também de forma protecionista, o que agravaria ainda mais a crise global.

Por isso, espera-se que caso o aumento dos impostos seja levado a OMC, o Brasil tenha uma ótima explicação além da proteção a uma teórica indústria nacional, ou esta manobra pode se tornar um grande tiro no pé. Pois, não é nem um pouco sensato para um país como o Brasil, com grandes aspirações como “potência emergente”, agir de tal forma, porque com a perda de confiança, além dos prejuízos embutidos na mesma, as recentes vitórias no comércio internacional que já foram difíceis, ficarão ainda mais complicadas de se repetirem no futuro.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Ajuste Fiscal de Longo Prazo

Luiz O.Stefanelli Potsch

Tramita atualmente no Congresso Nacional, em caráter de urgência, devido a pressões do Executivo, o Projeto de Lei 1.992/07, que funda a Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp). Sua aprovação acarretará, no futuro, uma importante economia de recursos por parte dos cofres do Tesouro Nacional.

As contas previdenciárias do funcionalismo público encontram-se extremamente desequilibradas. Enquanto os 28,1 milhões de aposentados e pensionistas do setor privado produzem um déficit anual ao redor de R$ 42 bilhões, os míseros 953 mil servidores federais serão responsáveis por um rombo, previsto para o final do ano, de R$ 57 bilhões.

Com a criação do Funpresp, os servidores ingressantes na carreira terão seus benefícios limitados pelo teto do INSS, que é hoje de R$ 3.689 ao mês. Assim, não haverá mais a absurda discrepância entre os aposentados dos setores público e privado. Atualmente os primeiros seguem, como limite, a remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), que está beirando a faixa dos R$ 30 mil mensais.

Para manter sua renda no mesmo patamar, será necessário que contribuam para o fundo de previdência complementar, igualmente como podem fazer os trabalhadores do setor privado – neste caso, um fundo particular. Isso também já ocorre com os funcionários públicos celetistas – arregimentados pela CLT – a exemplo dos do Banco do Brasil (Previ), Caixa Econômica (Funcef) e Petrobras (Petros).

O projeto mostra-se uma medida de ajuste fiscal apenas de longo prazo, pois, como já afirmado, afetará somente os que ingressarem na carreira após o início da vigência da lei. Segundo Garibaldi Alves¹ , atual ministro da Previdência Social, passando a vigorar o Funpresp, o déficit começará a cair em 10 anos, até ser extinto em 30.

As recentes reformas previdenciárias, que afetaram prioritariamente os funcionários públicos, têm sido alvo de acusações – veiculadas principalmente em cartilhas sindicais² em geral – de estarem promovendo um “verdadeiro desmonte do serviço público” e de se posicionarem “de acordo com os interesses do setor financeiro”. Tal argumentação não passa de uma busca desesperada em defesa de seus inegáveis privilégios. Essas medidas, ao contrário do que se afirma, serão benéficas pelo fato de reduzirem o expansionismo fiscal brasileiro – abrindo margem para uma política monetária menos austera –, além de elevar, conseqüentemente, o baixo nível de poupança nacional.



¹ Disponível em: http://oglobo.globo.com/pais/mat/2011/09/19/governo-articula-para-aprovar-fundo-de-previdencia-complementar-925400345.asp.

² Como exemplo, a elaborada pela Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Previdência Social (ANFIP), em 2003. Disponível em: www.uel.br/projetos/ssrede/cartilha_desmonte4.pdf.

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Considerações sobre a SELIC: Ensaio do BC como organismo do Estado brasileiro.

Amiris de Paula

Há dias da próxima reunião do COPOM, nota-se uma costumeira agitação do mercado. São investidores, sindicalistas, representantes da indústria e do comércio se degladiando na discussão sobre a grande expectativa existente para a queda da SELIC. No último encontro do comitê, o mesmo chegou a reconhecer que houve uma substancial mudança no ambiente macroeconômico desde sua última reunião, “de modo a justificar uma reavaliação, e, eventualmente, reversão, do recente processo de elevação da taxa básica". Sendo assim, presenciou-se um contra movimento das constantes altas da taxa SELIC: houve redução da mesma para 12,00% a.a., "sem viés". A decisão em si já gerou um sobressalto generalizado. Contudo, sua quase unanimidade foi o mote do espanto: a ata divulgada da 161ª reunião mostra que seus membros não pretendiam aumentar ainda mais a taxa. E mesmo os dois votos contrários contra a queda da SELIC não sugeriram seu aumento, mas sim foram pela manutenção da taxa em 12,50% a.a.

Dentre as opiniões acerca da diminuição da taxa, há o setor industrial. Com uma nota breve e direta sobre a medida do COPOM, o presidente em exercício da Fiesp, José Guilherme Ometto, afirma que "ao preservar uma postura pouco sensível ao momento global e nacional, a autoridade monetária brasileira pode, assim como aconteceu na crise de 2008, estar incorrendo no grave erro do excesso de conservadorismo e intensificando a desaceleração da atividade econômica, já em curso". A preocupação é real e se torna ainda mais válida ao analisar que o crescimento da indústria em agosto, segundo o IBGE, foi de apenas 0,2%. Nota-se ainda uma série de retrações na produção física da indústria, seja ela mensal, de 0,3%, trimestral, de 1,1%, anual, de 1,4% ou no acumulado de 12 meses, de 2,9%. Em nota oficial, o presidente da Força Sindical, Paulo Pereira afirmou que as altas consecutivas "aniquilaram" a produção industrial. Pereira ainda afirma que essa diminuição retardatária da taxa de juros demorará alguns meses para refletir no desenvolvimento do setor.

O comércio recebeu a queda com surpresa. A avaliação do COPOM para o setor foi positiva, ao registrar um aumento das vendas do comércio ampliado em 0,5% em junho, em relação a maio, totalizando um crescimento mesmo em 3,1% no trimestre encerrado em junho, relativamente ao terminado em março. Porém, apesar do otimismo do Comitê quanto ao setor, o presidente da Associação Comercial de São Paulo (ACSP), Rogério Amato, avaliou com respaldo a medida. Ele tomou a queda como uma medida preventiva do BC contra os sinais de desaceleração da produção industrial. Contudo, espera mais da próxima reunião do COPOM ao afirmar que espera "que o BC utilize também outros instrumentos para evitar que a desaceleração observada nos vários setores se aprofunde”.

A queda da SELIC também pode ser analisada pela ótica da dívida governamental: representa uma mastodôntica cifra que não vai mais sangrar para as contas bancárias dos detentores de títulos da dívida, historicamente sendo acostumados a ganhar em operações financeiras. Nas palavras do professor Otto Nogami, do Insper, "Está enraizada no brasileiro a cultura de uma rentabilidade alta com o juro". Torna-se nítida, então, o porquê dessa tendência de redução deixar tantos agentes do mercado insatisfeitos.

Até o mercado financeiro, surpreendentemente, avaliou positivamente a postura de corte da SELIC. O presidente do Instituto Brasileiro de Executivos de Finanças de São Paulo (IBEFSP), Keyler Carvalho Rocha, avaliou que “a decisão do Copom, iniciando agora o ciclo de cortes dos juros, aliada aos compromissos fiscais do Governo, constituem o cenário que consideramos ideal para o País”.

Ao não adiar ainda mais uma queda da SELIC, bem como levar em consideração fatores como o cenário mundial e a pressão inflacionária da alta das commodities no mercado mundial, o BC insuflou o mercado. A tendência de uma nova queda da taxa de juros mostra uma tênue mudança de comportamento, sendo apoiada por quase todos os setores da economia nacional. Apesar da tradição de indolência do BC, especialmente no que tange à taxa de juros, essa atitude do mesmo indica o prelúdio de uma mudança de comportamento, ainda que muito tímida, da instituição. É claro que esta queda não fará com que o Brasil deixe de ocupar o posto de liderança no ranking de juros reais mundial. Não obstante, como afirma Delfim Neto: “As afirmações de que o BC abriu mão de sua “independência” ou abandonou o sistema de metas de inflação para atender o governo, além de irresponsáveis ofendem a memória alheia. (...) A decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) de cortar a taxa básica de juro talvez tenha sido a primeira demonstração em muitos anos de um BC independente perante o sistema financeiro privado, quer dizer, voltar a ser um organismo do Estado brasileiro".

domingo, 9 de outubro de 2011

A que preço o Brasil alcança superávits comerciais?

Edinara Oza Dias

Em janeiro do ano passado a balança comercial brasileira obteve déficit de 1,8 bilhões de dólares, segundo dados apresentados nas séries temporais do Banco Central. Desde então os superávits comerciais foram consecutivos. No ultimo mês de setembro o saldo, até o dia vinte e um, foi positivo em US$ 3 bilhões, o que representa um aumento de 23,6% se comparado ao mesmo período do ano passado.

Esse resultado positivo embora, no primeiro momento, pareça muito bom para o nível de atividade econômica, na verdade, em uma análise um pouco mais aprofundada indica o pouco grau de desenvolvimento do país.

Através da abertura da pauta de exportação, disponível na página do Ministério do Desenvolvimento, percebemos que o país exporta produtos, majoritariamente, básicos, ou seja, que não passam por processo de beneficiamento antes do envio ao exterior. Ao não beneficiar o produto, o valor agregado é reduzido e o desenvolvimento da indústria interna não é incitado – para esse desenvolvimento outras políticas econômicas devem ser adotadas – e assim os níveis de emprego não são ampliados, o que freia o desenvolvimento.

A importação de bens primários, no entanto, não é uma característica atual da balança comercial brasileira. Isso acontece desde o processo de viabilização da ocupação do território deste país enquanto colônia portuguesa, quando o plantio de cana-de-açúcar tornou-se o “grande negócio” e rendeu lucros extraordinários, apesar de não sustentados em longo prazo, para os empresários do ramo. No decorrer da história, temos ainda os metais preciosos, o algodão e o café, todos commodities, como protagonistas no comércio exterior. Entre janeiro e agosto de 2011, o açúcar e o café continuam a obter destaque na economia ocupando o quarto e quinto lugares, respectivamente, no ranking de exportações.

Além de desestimular a indústria interna, com uma economia exportadora, de bens primários, o nível de atividade do país fica muito vulnerável a oscilações da demanda externa. Sendo assim, mesmo que um equilíbrio da balança comercial seja relevante, o desenvolvimento da indústria interna deve ser priorizado.

quarta-feira, 5 de outubro de 2011

O mundo não é uma ilha.

Rayssa Bolelli

O clima na zona do euro é de incerteza. Enquanto os países da União Européia (principalmente França e Alemanha) discutem um segundo pacote de ajuda a Grécia, e o governo grego anuncia só ter dinheiro para operar até meados de novembro, há uma grande tendência de que,independente da aprovação deste pacote, o calote grego seja inevitável. Porém, mesmo não resolvendo o problema, esta segunda ajuda daria tempo para uma possível retomada de confiança de economias em risco, como as da Espanha e Itália, evitando assim que um possível calote da Grécia induza há um calote destes países, o que agravaria ainda mais a crise.

Contudo, os temores da crise não são sentidos apenas pelos EUA e por países pertencentes à zona do euro. A desaceleração das economias européias afetou o preço das commodities, e países que as tem como principais pautas de exportação, já começam a sentir os efeitos da crise. No Chile, por exemplo, na exportação de seu principal produto,o cobre, houve uma queda de 25%, e apesar da contínua ascensão econômica, haverá uma desaceleração neste segundo semestre. Já no Brasil a expectativa é outra. Espera-se que a queda no preço das commodities ajude a reduzir a inflação.

Ao analisar a crise por esta ótica, esquece-se novamente de um fator crucial no mundo atual, nada é tão dependente assim de apenas um fator. Assim como não somente a Europa e os EUA sentem os efeitos da crise em países como Grécia e Portugal, os preços das commodities brasileiras não são inteiramente dependentes do mercado europeu e estado-unidense. Há de se levar em consideração o importante papel da China nas importações de commodities metálicas e relacionadas a energia, que hoje correspondem a 40% e 18% respectivamente. Quanto as commodities agrícolas, o recente World Economic Outlook (WEO) arrisca a previsão de uma recuperação nos preços, devido a fatores como os baixos estoques, condições climáticas imprevisíveis e peculiaridades locais dos países produtores.

Portanto, os dados só confirmam a atmosfera de incerteza vigente. A queda das bolsas em todo o mundo, a emigração em massa de europeus para suas antigas colônias, os recentes protestos em Wall Street, as contradições e incertezas dos mercados... Todos estes fatos mostram que não há como fazer apostas sólidas para o futuro. Esta crise está mudando não só as dinâmicas econômicas, mas também sociais. Não há como saber quais previsões se confirmarão. Na atual configuração mundial nenhum país é isolado o suficiente para não ser afetado por estas mudanças. Deste modo é insensato para o Brasil fazer políticas com base puramente em algum destes palpites. O momento é para ações rápidas, concretas e lúcidas, e não para jogos de azar.

domingo, 2 de outubro de 2011

Espírito Santo: crescimento X infra-estrutura

Deyvid Alberto Hehr

O bom desempenho da economia do Espírito Santo no ano de 2010 e início de 2011, momento em que o estado alcançou um crescimento do PIB de 13,3% contra um aumento de 7,5% do PIB nacional em 2010, e um crescimento de 5,9% do PIB no primeiro trimestre de 2011 em comparação com o quarto trimestre de 2010, segundo dados do Instituto Jones dos Santos Neves, pode nos levar à grande ilusão de que esse crescimento é sustentável no longo prazo e que a discussão acerca dos problemas de infra-estrutura, que tem se tornado um grande gargalo no desenvolvimento do estado, sejam esquecidos e retornem apenas quando o quadro positivo
se inverte.

Tal resultado foi e vem sendo alavancado pelo desempenho da indústria, da construção civil e das exportações. No entanto, para que o ES continue crescendo de forma robusta, fazem-se necessários investimentos em diversos segmentos da infra-estrutura estadual. Nessa perspectiva, é preciso melhorar todos os modais de transporte e logística, a fim de ampliar a eficiência dos mesmos e induzir um desenvolvimento sustentável.

Para que isso ocorra, é importante que as estradas rurais estejam em boas condições de escoar suas produções e facilitar o próprio cultivo das lavouras, uma vez que a agricultura do estado se dá por pequenas propriedades rurais. Alinhado as essas estradas, temos as rodovias federais que cortam o ES e se encontram num estado precário de tráfego, sobretudo a BR 101 e a BR 262, o que faz com que os custos de transporte aumentem em até 35%, segundo estudo realizado pela Fundação Dom Cabral.

Além das rodovias, o sistema portuário também se encontra em situação delicada, posto que se perde muito tempo para atracar e a profundidade do canal não permite a entrada de navios de grande porte, o que leva a grandes perdas e aumento no custo de produção. Atrelado a isso, temos a caótica situação do aeroporto de Vitória que devido a sua fraca estrutura fazem o número de vôos serem reduzidos e impossibilita ao estado receber aviões de grande porte, prejudicando os fluxos de pessoas e mercadorias para o estado.

Ao sairmos dos problemas de transportes, temos outras questões na atração de novas empresas e, por conseqüência, de novos empregos, tal qual o fornecimento de energia elétrica. Isso se deve ao fato que o estado não é auto-suficiente na produção, e produz apenas cerca de 20% do que utiliza, o que o faz importar cerca de 80% do seu consumo das usinas de Furnas e Itaipu.

Contudo, nota-se que devido a sua localização estratégica o ES deveria ser um centro de escoamento da produção nacional tanto no âmbito doméstico quanto no âmbito internacional. No entanto, no que tange às exportações e importações de granéis, automóveis, aço e etc. o estado ainda consegue se sobressair. Mas no que remete aos produtos classificados como não-commodities, como por exemplo, o setor de fruticultura, o mesmo não consegue atender à demanda e perde espaço no cenário nacional.

Diante do exposto, pode-se constatar que embora o ES esteja crescendo acima do crescimento nacional, ainda esbarra em antigos problemas, que só serão sanados com altos investimentos e um bom planejamento estratégico discutido com todos os âmbitos da sociedade. Nessa perspectiva, uma das saídas seria atrair parcela significativa dos aproximadamente 1,3 trilhões de reais em infra-estrutura que o governo federal anunciou com o PAC II.